Faltam 14 dias para o Draft de Expansão do Seattle Kraken! No dia 21 de julho iremos descobrir como será o time da mais nova franquia da NHL. Pensando nisso, a equipe da NHL Brasil trouxe uma série de matérias sobre o evento, incluindo como funciona o Draft até quais jogadores nós protegeríamos. Hoje o assunto é a última expansão da NHL, em 2017, com o Vegas Golden Knights. Como a franquia obteve tanto sucesso?


Quando o Vegas Golden Knights finalizou seu processo de expansão, havia muita desconfiança sobre qual seria o futuro da franquia quando a competição começasse para valer. No papel, o elenco estava longe de ser algo que enchesse os olhos. Marc-Andre Fleury era o maior nome escolhido e acabou por automaticamente se tornar a cara da franquia. Mas, como bem sabemos, a primeira temporada de Vegas na NHL foi apoteótica e a franquia chegou a Stanley Cup em seu primeiro ano de existência e até hoje possui uma franquia muito competitiva, que chegou aos playoffs em todas suas temporadas, incluindo duas Finais de Conferência. 

Muito se debate o fato de Vegas ter sido ajudada de fato pela NHL. Muito se fala que a franquia recebeu uma equipe pronta, com jogadores de ponta, coisa que não aconteceu com as últimas franquias. Bem, isso não é verdade. 

Mas então como Vegas conseguiu montar essa equipe que vem fazendo sucesso?

Temos algumas respostas diferentes para isso e vamos tentar explicá-las da melhor maneira para vocês.

Visão e estrutura do Vegas Golden Knights

Desde o primeiro dia oficial de operações, o Vegas Golden Knights vem tomando decisões que vão se mostrando grandes acertos. O dono majoritário da franquia, Bill Foley, se cercou de grandes e competentes nomes do mundo do hockey para construir a franquia. A começar com experiente general manager George McPhee, que serviu por 17 anos (1997-2014) como GM do Washington Capitals, sendo o responsável direto pelo processo de reconstrução da franquia que trouxe nomes como Alex Ovechkin, Evgeny Kuznetsov, John Carlson, Nicklas Backström e outros, que ajudaram a conduzir a franquia a seu inédito título em 2018. 

Além de McPhee, a franquia também foi atrás do então promissor nome que despontava na WHL (Western Hockey League). Kelly McCrimmon, o então dono, general manager e técnico da franquia Brandon Wheat Kings. Após chegar na franquia em 1988, McCrimmon iniciou sua escalada e se tornou GM logo na temporada seguinte. Sob sua administração a equipe triunfou em 1995-1996. Em 2001, McCrimmon comprou a franquia e alguns anos depois também se tornou técnico da mesma, levando a equipe até as finais na posição de dono, GM e técnico!!!

Então, após 26 anos na WHL, Kelly McCrimmon assinou um contrato para se tornar general manager assistente do Vegas Golden Knights, que garantiu os serviços do candidato após bater a concorrência de ninguém menos que o Toronto Maple Leafs. 

Kelly McCrimmon e George McPhee
Kelly McCrimmon e George McPhee, as cabeças que fizeram o projeto do Vegas Golden Knights (Foto: Reprodução/NHL)

Com seu front office tomando forma, o Vegas Golden Knights rapidamente foi ao mercado atrás de seu primeiro treinador e trouxe o experiente Gerard Gallant, que já havia passado por Columbus e Florida.

E para mostrar que não pouparia investimentos para ter uma franquia de sucesso e com estrutura de ponta, os Golden Knights anunciaram a compra da franquia San Antonio Rampage, da AHL e que pretendiam mudar a mesma para a cidade de Henderson, que fica a pouco mais de 25 quilômetros de Las Vegas. Assim nasceu oficialmente o Henderson Silver Knights, equipe afiliada aos Golden Knights. Os Golden Knights em parceria com a cidade de Henderson estão finalizando a construção da Dollar Loan Center, nova arena multiuso da cidade que será a casa da franquia. Com isso, a franquia manterá seu time afiliado e suas principais promessas muito próximos da equipe principal, um feito que muitas equipes ainda não conseguiram. 

Competência da franquia

Com direção e comissão técnica montadas, iniciou-se todo o processo de preparação para o Draft de Expansão e aqui chegamos em um ponto onde basicamente só houveram acertos da franquia. Sabendo da necessidade de certos times de se livrarem de contratos complicados, Vegas começou a ouvir propostas de algumas dessas franquias e engatilhar algumas trocas para quando tivesse início o processo. E foi em algumas dessas negociações que a franquia acabou por identificar e adquirir peças que viriam a se tornar vitais até os dias de hoje para a equipe, como a famosa “Misfit Line” (Reilly Smith, William Karlsson e Jonathan Marchessault). Tudo isso conduzido principalmente por George McPhee e Kelly McCrimmon. 

William Karlsson, Jonathan Marchessault e Reilly Smith
William Karlsson, Jonathan Marchessault e Reilly Smith, a “Missfit Line”. (Foto: Reprodução/The Athletic)

Mas como isso foi possível? Vamos lá!

Reilly Smith havia renovado seu contrato com o Florida Panthers em julho de 2016 e o novo vínculo que lhe pagaria 5 milhões de dólares por temporada por 5 anos, entraria em vigor somente na temporada 2017-2018. Porém após a temporada 2016-2017, onde em 80 jogos o jogador anotou apenas 37 pontos, o Florida Panthers decidiu aproveitar a janela de expansão e enviar o contrato considerado “perigoso” para Vegas. Para isso, os Panthers usaram um outro jogador como pagamento para Vegas adquirir o contrato de Smith: Jonathan Marchessault, que vinha de uma boa temporada com a franquia da Flórida. Com isso, a negociação foi feita da seguinte forma:

Para Vegas: Reilly Smith e Jonathan Marchessault ficaria disponível no Draft de Expansão para a escolha da equipe.

Para Flórida: uma escolha de 4ª rodada no Draft 

Em sua primeira temporada com a franquia do deserto, Reilly Smith anotou 60 pontos (22 gols e 38 assistências) e Jonathan Marchessault anotou 75 pontos (27 gols e 48 assistências).

A outra peça da fortíssima linha veio em uma troca semelhante. O Columbus Blue Jackets precisava se livrar do pesado contrato de David Clarkson, que devido a lesões já não atuava mais, mas ainda carregava mais três anos com um valor de 5,2 milhões de dólares. Como a franquia de Vegas dificilmente enfrentaria problemas no teto salarial por alguns anos, assumir esses contratos não seria um problema. Dessa forma, a negociação foi feita da seguinte forma: Columbus enviou sua escolha de 1ª rodada do Draft de Entrada de 2017, uma 2ª escolha do Draft de 2019 e o contrato de David Clarkson, em retorno, deixaria William Karlsson disponível para Vegas selecioná-lo no Draft de Expansão. 

Em sua primeira temporada com Vegas, Karlsson anotou 78 pontos (43 gols e 35 assistências). Sua maior marca da carreira até então havia sido 25 pontos. 

Sim, amigos, a “Misfit Line” foi um belo presente para o Vegas Golden Knights, que através de sua mais do que competente direção conseguiu extrair o melhor retorno possível para aceitar contratos considerados ruins e que alguns times estavam desesperados para se livrarem. O que nos leva ao próximo tópico…

Uma combinação incomum de eventos

Quando o Draft de Expansão ocorreu pela última vez em 2000, muitas coisas eram diferentes na NHL, mas talvez o fator que mais impactou este novo Draft em 2017 foi a existência do teto salarial – ou salary cap como é conhecido. Instituído somente após o lockout de 2004-2005, o cap é um mecanismo projeto para gerar equilíbrio e é adotado em três das quatro principais ligas americanas. Com o salary cap apertado e contratos ruins no elenco, muitos general managers vislumbraram uma grandiosa oportunidade para resolver essa questão e conseguir um alívio na folha salarial. E talvez foi nesse ponto da história onde a nova franquia de Vegas contou também com uma estranha e não intencional generosidade por parte dos GMs das demais franquias. Muitos dos general managers não haviam passado por um processo de expansão, mas sabem quem já era GM na NHL naquela época? George McPhee. Tendo vivido diferentes processos de expansão, reconstruído o Washington no início da era do teto salarial e conduzido a franquia de Washington durante o processo de crescimento do cap, McPhee sabia desse desespero de outros GMs e como citado anteriormente, capitalizou em cima disso. 

Marc-Andre Fleury, Deryk Engelland, Brayden McNabb e Jason Garrison no Draft de Expansão do Vegas Golden Knights
Marc-Andre Fleury, Deryk Engelland, Brayden McNabb e Jason Garrison no Draft de Expansão do Vegas Golden Knights. (Foto: Reprodução/NHL)

Além das trocas já citadas, algumas equipes optaram por deixar alguns talentos consideráveis desprotegidos e proteger alguns que são passíveis de algum debate. Também, outros times precisaram proteger jogadores veteranos devido à cláusulas de não movimento em seus contratos. Vamos a alguns exemplos!

  • O Pittsburgh Penguins escolheu proteger Matt Murray e enviou uma 2ª escolha de Draft para Vegas selecionar Marc-Andre Fleury;
  • O Boston Bruins precisou deixar o defensor Colin Miller disponível, por não ter espaço na lista para o jogador devido à cláusula de não movimento de alguns veteranos;
  • O Washington Capitals escolheu proteger Dmitri Orlov e o veterano Matt Niskanen e deixou o talentoso Nate Schmidt desprotegido para Vegas; 
  • O St Louis Blues escolheu proteger Patrik Berglund e Ryan Reaves e deixou David Perron disponível para ser selecionado por Vegas; 
  • O Nashville Predators deixou James Neal disponível para ser escolhido por Vegas. 

Todos esses jogadores citados foram fundamentais na formação da espinha dorsal da equipe, que em sua temporada inaugural chegou às finais da Stanley Cup. Alguns dos nomes, como Fleury e Neal, foram escolhas difíceis, porém necessárias feitas por suas antigas equipes. Vegas, que não teve nada a ver com isso (ou talvez teve), fez as escolhas que julgou melhor para sua equipe – e julgou muito bem. 

A partir daí, Vegas não parou mais. A equipe continua atuante no mercado da NHL, buscando peças valiosas como Max Pacioretty em 2018, Mark Stone em 2019 e mais recentemente Alex Pietrangelo em 2020. A comunidade abraçou a franquia como poucas vezes visto, a torcida lota todos os jogos possíveis e a cidade acabou se tornando um mercado atraente para grandes estrelas. 

A liga projetou uma franquia que não estivesse fadada ao fracasso imediato, que oferecesse uma mínima competição e que pouco tempo de organização pudesse subir o patamar e se firmar. O resultado provavelmente foi algo 10 vezes além do esperado e os fatores citados neste texto deixam isso bem evidente. É possível argumentar sobre a mudança das regras e como ela pode ter influenciado no resultado da formação da franquia, mas não se pode argumentar contra a excelente administração que dirige o Vegas Golden Knights e todos os diversos acertos que levaram a tal resultado também.


Nos próximos dias teremos mais textos na série sobre o Draft de Expansão do Seattle Kraken. Fiquem de olho no Twitter e Instagram da NHL Brasil!