Wayne Gretzky, Bobby Orr, Gordie Howe e Mario Lemieux são algumas das grandes estrelas que o hóquei nos proporcionou e que impactaram o jogo tanto dentro como fora do rinque. Infelizmente, jogaram em uma época em que a tecnologia para aquisição e controle de dados era limitada. Portanto, analisar o real impacto que eles tiveram dentro do gelo acaba ficando inviável. Isso não tira nenhum mérito de tais jogadores, os dados, resultados e os títulos falam por si. Apenas deixamos de ver o quão a mais eles fizeram de uma forma mais analítica e detalhada.

Wayne Gretzky Skating
STF/Associated Press

Ao contrário das décadas anteriores, em que não se tinha tecnologias tão bem definidas para aquisição e armazenamento de dados, hoje os dispositivos e sensores wearables – aparelhos vestíveis como pulseiras eletrônicas, coletes, dispositivos GPS e outras tecnologias inteligentes – nos permitem coletar cada vez mais dados e, assim analisar de uma forma mais pontual cada envolvimento do jogo.

Esse panorama tecnológico da atualidade possibilitou a obtenção dos dados de jogada-a-jogada (play-by-play data). Dessa maneira, analisar o desempenho e impacto dos times e jogadores dentro do gelo ficou muito mais “fácil”, uma vez que podemos olhar além da percepção dos espectadores e nos aprofundar no funcionamento interno do jogo. Com base no quadro, vamos analisar como as estrelas modernas impactam os times, defensivamente e ofensivamente, quando estão no gelo.

O conjunto de dados utilizado compreende as temporadas de 2010-2011 até 2020-2021. Uma amostra bem interessante na qual será possível ver de perto a trajetória de jogadores como Sidney Crosby, Alex Ovechkin e Anze Kopitar.

Nosso intuito é verificar se quando as estrelas estão no gelo as equipes possuem uma forma específica de atacar, defender ou se isso é apenas o estilo de jogo da franquia. Isso é interessante muito pelo que pontuamos anteriormente, como o avanço tecnológico facilitou na compreensão de padrões e, por conseguinte, criar manobras táticas para conter um único jogador ou linhas ofensivas, três atacantes, inteiras. 

Vale lembrar que apesar da grande quantidade de dados que a NHL gera, em um texto anterior vimos como a sorte, link aqui, é algo que afeta o hóquei e dado o contexto do esporte isso faz toda a diferença.

Para ver o impacto dos jogadores iremos selecionar para nosso texto três atacantes. Essa seleção dos jogadores foi baseada no desempenho durante as temporadas analisadas e aqueles que estão a mais tempo na liga, mínimo seis anos, para que possamos ver toda uma trajetória. Outro ponto é que não selecionei jogadores de um mesmo time.

Assim veremos como eles contribuem para equipes dentro e fora do gelo. Outras considerações são em respeito a força dos times, 5-contra-5, e estamos considerando apenas os jogos que finalizaram no tempo regular, três períodos de 20 minutos. Jogos que foram para prorrogação ou shootout foram desconsiderados.

Os três atacantes selecionados são: 

  • Alex Ovechkin;
  • Sidney Crosby;
  • Anze Kopitar.

Bônus: Connor McDavid

Para os gráficos, vamos utilizar um formato de densidade que foi desenvolvido pelo professor Tanaka Kitiro em 1950 e que foi incorporado à linguagem de programação R através da biblioteca metR. Em vez de traçar a frequência geral das tentativas de disparos, podemos apenas traçar as diferenças entre a frequência com que uma equipe ou jogador chuta para gol de uma determinada área e a frequência com que uma equipe média o faz.

Grafico Densidade Times 2020-21

Esses gráficos ainda mostram a frequência relativa de tentativas de chutes em uma determinada área.  Mas a diferença crucial é que cada gráfico é relativo à média da liga e não a si mesmo. Em outras palavras, áreas mais densas e mais escuras indicam que uma equipe tende a ter a maior parte de suas tentativas de chute do local correspondente em relação à frequência com que a liga em geral.

Para os gráficos foram considerados os locais dos chutes que foram ao gol e os que resultaram em gols. Além disso, estamos considerando apenas os chutes que ocorreram na zona ofensiva do time atacante. 

Algumas observações:

  • O time do Boston Bruins, Columbus Blue Jackets, St. Louis Blues, Winnipeg Jets e Washington Capitals tendem a atacar menos da frente do gol em relação a média da liga;
  • Edmonton Oilers, New York Rangers, New York Islanders, San Jose Sharks, Tampa Bay Lightning, Toronto Maple Leafs e Vegas Golden Knights tendem a atacar mais da frente do gol em relação a média da liga.

Agora vamos voltar nossa atenção as grandes estrelas.

Impacto isolado Alex Ovechkin

Impacto Great 8

Durante 11 temporadas, Alex Ovechkin tem um total de 3024 chutes e 397 gols.  Temos então um porcentagem de chute (Sh%) de aproximadamente 13%. Isso quer dizer que a cada 100 chutes 13 deles acabaram em gols. Graficamente podemos ver uma grande tendência do jogador atacar pelas laterais, mais especificamente na parte alta da zona do faceoff.

Washington Capitals sem Alex Ovechkin no gelo

Density plot WSH

O time de Washington, sem Ovechkin, tem ao longo de 11 temporadas 16386 chutes e  1540 gols, o que representa um porcentagem de chute (Sh%) de 9%. O gráfico mostra uma clara mudança no estilo de ataque quando o jogador, Alex Ovechkin, está no gelo pelo time do Washington Capitals. Quando temos Ovechkin no gelo, os chutes acontecem muito mais nas áreas dos faceoffs. Com Ovechkin fora…..

Impacto isolado Sidney Crosby

Density Chart 87

Durante 11 temporadas, Sidney Crosby tem um total 1909 chutes e 301 gols.  Temos então um porcentagem de chute (Sh%) de aproximadamente 15%. Isso quer dizer que a cada 100 chutes 15 deles acabaram em gols. Graficamente podemos ver que muitos dos chutes e gols aconteceram próximo ao gol adversário sendo em sua maioria na frente do gol.

Pittsburgh Penguins sem Sidney Crosby no gelo

Density Chart PIT

O time de Pittsburgh, sem Crosby, tem ao longo de 11 temporadas 18816 chutes e  1686 gols, o que representa um porcentagem de chute (Sh%) de 9%. Graficamente temos um contraste bastante interessante. Com Sidney Crosby no gelo, o time dos Pittsburgh Penguins tende a concentrar seu ataque frente ao gol adversário. Já com Sidney Crosby fora, vemos o time atacando de outros locais mais distantes do gol e pelas laterais, buscando com uma frequência maior o lado esquerdo do gol adversário.

Impacto isolado Anze Kopitar

density chart 11

Durante 11 temporadas, Anze Kopitar tem um total de 1587 chutes e 217 gols.  Temos então um porcentagem de chute (Sh%) de aproximadamente 13%. Isso quer dizer que a cada 100 chutes 13 deles acabam em gols. Graficamente podemos ver como o ataque se concentra na frente do gol e pelo lado esquerdo do gol adversário.

Los Angeles Kings sem Anze Kopitar no gelo

density la

O time de Los Angeles, sem Kopitar, tem ao longo de 11 temporadas 16063 chutes e  1239 gols, o que representa um porcentagem de chute (Sh%) de 7%. Através do gráfico podemos ver um movimento muito parecido com que vimos ao analisarmos Sidney Crosby. A diferença é que a presença na frente do gol continua, mas vemos que é possível notar o time buscar as laterais do gelo sendo a maioria chutes vindo da área do faceoff.

Impacto isolado Connor McDavid

density chart 97

Durante 6 temporadas Connor McDavid tem um total 821 chutes e 144 gols.  Temos então um porcentagem de chute (Sh%) de aproximadamente 17%. Isso quer dizer que a cada 100 chutes 17 deles acabaram em gols. Muito se compara Connor McDavid e Sidney Crosby e apesar de terem estilos de jogos bem distintos podemos ver que temos um resultado bem parecido quando atacamos sempre buscando a frente do gol adversário.

Edmonton Oilers sem Connor McDavid no gelo

density chart edm

O time de Edmonton, sem McDavid, tem ao longo de 6 temporadas 6688 chutes e  505 gols, o que representa um porcentagem de chute (Sh%) de 7%. Graficamente temos um grande contraste. Sem McDavid no gelo Edmonton não tem domino na frente do gol como visto o que faz o time atacar de vários outros locais, mas nada muito específico que pudemos notar nos outros times.

Assim, chegamos ao final de mais texto. O grande intuito foi apresentar de maneira gráfica como os atacantes tendem a atacar e posicionarem.  O que mostra o quanto nós seres humanos gostamos de estar na zona de conforto mesmo em um esporte onde tudo acontece de maneira tão rápida e dinâmica. Muito mais do que isso, meu intuito é que vocês tirem as próprias conclusões a respeito dos gráficos. No próximo texto veremos o impacto dos defensores, afinal de contas não adianta ser eficiente de um lado e ineficiente do outro.