O 4 Nations Face-Off, competição entre as seleções do Canadá, Suécia, Finlândia e Estados Unidos, está agendado para o próximo dia 12 de fevereiro, com sedes em Montreal e Boston. Foi criado há cerca de um ano, para substituir o All-Star Game de 2025. Nada disso é novidade para quem acompanha hóquei. Mas, desde seu anúncio, o curto torneio indica possíveis novos rumos para o esporte internacional — algo que se aprofunda com o anúncio de uma nova Copa do Mundo, em 2028, que a Liga pretende organizar sozinha. É a NHL forçando a queda de braço com o Comitê Olímpico Internacional e, agora, com a Federação Internacional de Hóquei no Gelo.
Em uma análise simples, o Four Nations Face-Off é mais um esforço da NHL para tornar o All-Star Game algo minimamente interessante. Desde a sua criação, em 1947, o jogo festivo foi, por décadas, um dos pontos altos da temporada: o momento em que os grandes astros se reuniam e o público era brindado com grandes performances — em que outra ocasião se teria Bobby Orr, Bobby Hull e Gordie Howe no mesmo time? Wayne Gretzky, Dale Hawerchuk e Steve Yzerman jogando juntos?

Para além do espetáculo para os fãs, o All-Star Game era um tira-teima entre os próprios jogadores. Vencê-lo ou ser MVP era como ser coroado o melhor entre os melhores e, assim, tinha-se grandes partidas, muitas delas acirradas e com placares elásticos, como o Wales 7-6 Campbell de 1984 ou Wales 6-5 Campbell na prorrogação em 1988 — Wales que hoje é a Conferência Leste, Campbell é a Conferência Oeste.
E, claro, o All-Star Weekend também tinha as competições de habilidades e as festividades para a comunidade local, oportunidade para torcedores da região-sede do evento conhecer atletas e ter um fim de semana voltado inteiramente ao esporte.
Mas é possível que tudo isso tenha cansado, e essa discussão vem sendo colocada à mesa nos últimos 20 anos, aproximadamente.
Não é à toa que, há um bom tempo, a NHL tenta inovar no formato do All-Star Game. E essa preocupação não é exclusiva do hóquei — a NBA também promove mudanças para deixar seu jogo das estrelas mais atrativo, e a realização do Pro Bowl, da NFL, passou a ser posta em xeque.
E aqui uma opinião meramente especulativa: talvez esses eventos atraiam menos interesse por, entre outros motivos, o mundo não ser o mesmo de 1980. Hoje há muitas outras formas de entretenimento disponíveis.
Se há 40 anos, as opções de diversão à noite eram um filme reprisado na TV ou um jogo entre as maiores estrelas do
hóquei, isso certamente incentivava pessoas a irem à arena ou ligar no canal de esportes. Agora, a NHL concorre com outros meios, e ficar em casa com tanta coisa para se fazer já não é algo entediante.
Rever o formato era necessário e, a princípio, chegou a ser divulgado que, em vez de jogo das estrelas, teríamos uma

Copa do Mundo em 2024. Não passou de um blefe — ou, talvez, de um “teste”, como pode ser constatado com o que veio a seguir. No fim das contas, o All-Star Game de 2024 aconteceu com algumas novidades.
Em um último esforço para atrair o público, sobretudo os mais jovens, a NHL trouxe celebridades para o evento. Assim, Jim Montgomery teve ao seu lado o, talvez, maior nome da música canadense Justin Bieber (no meu coração, ninguém supera Neil Young, Bryan Adams e Joni Mitchell, mas não posso brigar com a realidade) enquanto Rick Bowness teve como associate coach a mais nova estrela do pop Tate McRae.
Mesmo com a presença de figuras tão midiáticas, a audiência do evento continuou caindo e, em 2024, registrou números menores que em 2023 segundo dados da ABC.
Além disso, não é só o público: os próprios atletas não parecem mais tão interessados na rivalidade que o All-Star Game um dia acirrou. Passaram a encarar como uma celebração com alguma competitividade — mas não o suficiente para se arriscar no gelo.
Independentemente de resultados e satisfações pessoais, o destino do All-Star Game para 2025 já estava selado: o tal jogo das estrelas daria lugar ao 4 Nations Face-Off.
De fato, o novo torneio resolve pelo menos um dos problemas recentes, a falta de competitividade. Matthew Tkachuk, da Seleção dos Estados Unidos, garantiu, em entrevista a The Athletic, que o campeonato vai ser encarado com mais seriedade pelos colegas. “Não vai ser um All-Star Game”, afirmou. “Garanto a você que os jogadores vão para cima.” O atacante dos Panthers enfatizou sua vontade de enfrentar o Canadá, valorizando a rivalidade entre as duas seleções.

Mas a ideia é que o All-Star Game volte em 2026 com sede já definida, o condado de Nassau, casa do New York Islanders. Esse plano reforça: o 4 Nations Face-Off é um teste e pode levar a um rompimento futuro entre a NHL e as entidades internacionais na organização de campeonatos entre seleções — o investimento em comunicação que tem sido feito para alavancar o 4 Nations Face-Off mostra a aposta da liga no formato.
Isso é curioso porque o All-Star Game sempre foi um evento querido pela NHL, por isso tanto drama para a liberação dos atletas para os Jogos de Inverno. Por causar choque de calendário. Em 1998 e em 2002, o All-Star Game foi realizado mesmo com as Olimpíadas, mas foi cancelado em 2006, 2010 e 2014, já que uma pausa longa demais era contraproducente.
A princípio, liberar os jogadores parecia interessante para a NHL. Era uma forma de divulgar o esporte e os próprios atletas preferiam o torneio olímpico.
Mas chegou uma hora que parou de valer a pena. Mesmo com a audiência caindo, o lucro do All-Star Game ainda era todo da liga, diferentemente do que acontece nas Olimpíadas. Assim, não houve liberação para 2018 e 2022.
Mas em meio a tudo isso, não é difícil perceber o óbvio: atletas gostam de representar seus países. O All-Star Game não dá tanto resultado. Torneios internacionais são lucrativos. Por que não organizar o próprio campeonato entre seleções?
O que veio a seguir foi uma série de anúncios e medidas que, no fim das contas, mostram queda de braço diplomática e jogos de interesses.
A NHL anuncia uma Copa do Mundo para fevereiro de 2024, no lugar do All-Star Game. Se o All-Star Game é algo

que interessa tanto, por que colocar uma Copa do Mundo no lugar? E se é possível uma Copa do Mundo no lugar do All-Star Game, por que não liberar os atletas para as Olimpíadas?
O All-Star Game de 2024 é mantido, mas o blefe se torna cartada com o All-Star Game de 2025 cancelado em favor do 4 Nations Face-Off. A pergunta persiste: Se o All-Star Game é algo que interessa tanto, por que colocar um torneio entre seleções no lugar? E se é possível um torneio entre seleções no lugar do All-Star Game, por que não liberar os atletas para as Olimpíadas?
Mas… a própria NHL respondeu ao liberar os jogadores para as Olimpíadas de 2026, em Milão e Cortina, e de 2030, nos Alpes Franceses. Mas, até segunda ordem, o All-Star Game de 2026 está mantido. Calendário inchado novamente, como em 1998 e 2002?
De quebra, a NHL, através do seu comissário Gary Bettman e do vice, Bill Daly, confirmaram as intenções de realizar a Copa do Mundo em 2028 e manter a periodicidade de quatro anos, intercalando com os Jogos Olímpicos — um padrão semelhante aos de futebol e vôlei.
Então, agora em janeiro, Darren Dreger, da TSN, traz a informação de que, em breve, a NHL e o sindicato devem oficializar a Copa do Mundo em 2028, mas sem qualquer envolvimento da Federação Internacional na organização.
Qual a intenção da Liga em romper com um órgão que, por anos, sempre foi parceiro na realização dos torneios, desde a clássica Canada Cup até a própria Copa do Mundo, que, desde 1996, teve apenas três edições? Ter o lucro e o controle todos para si?
Um título sem sanção da entidade máxima internacional, vinculada ao Comitê Olímpico, tem legitimidade?

Se as seleções brigam por troféus no gelo, fora dele as entidades disputam o destino do jogo e, ultimamente, as medidas tomadas por Bettman e a NHL trazem mais questões que respostas.
Jogos internacionais no lugar do All-Star Game
Estabelecido em 1947, o All-Star Game quase sempre alinhou equipes internas: de campeões da Stanley Cup enfrentando os All-Stars da liga a times representando as diferentes conferências ou suas divisões.
Mas jogos internacionais no All-Star Game não surgiram com o 4 Nations Face-Off. Em 1979, um All-Star Team da liga enfrentou a poderosa seleção da União Soviética em uma série de três jogos chamada Challenge Cup. Os soviéticos venceram por 2 a 1. Em 1987, o formato foi repetido, dessa vez chamado Rendez-vous ’87 e em dois jogos, com a seleção soviética novamente levando vantagem no placar agregado por 8 a 7. Em artigo recente para The Hockey Writers, Colin Newby chamou o Rendez-vous de “Melhor experiência para um All-Star Game.”
Entre 1998 e 2002, em vez de Conferência Leste e Conferência Oeste, o All-Star Game inovou nas escalações: de um lado, All-Stars norte-americanos e, do outro, All-Stars “do resto do mundo” que eram, na verdade, os melhores europeus da NHL. A América do Norte venceu três jogos, incluindo um 14 a 12 em 2001, e o Mundo levou a melhor duas vezes.
Texto por: Thiago Leal.